
O dia era domingo, verão estilo aquecimento global, praia lotada, ruas lotadas, coletividade disposta a ver o sol a pino. Corpos ao sol, estirados na areia, marzão domesticado como piscina. Ambulante de coxinha, empada, sanduíche, salada de frutas, queijo, mate e o que mais couber no isopor.
Ás 13h, o casal em lua de mel - vieram de Minas para curtir o tal do Rio de Janeiro efervescente que disseram pra eles -, cansados do calor, da multidão apertada na areia e do soléu - resolveram voltar para o hotel.
- Vamos pela sombra tá, eu não aguento mais tanto sol, disse a mulher, franzina, acanhada e quase um pimentão.
- Tá bom, meu amor. Então vamos pela calçada do outro lado da rua, comentou o marido.
Foram. Na calçada do outro lado da rua (onde há sombra por conta dos prédios gigantescos), enquanto eles passam pelo prédio número 53, toca o orelhão. Eles se olham, olham em volta, de repente alguém estava esperando a ligação do orelhão. Ninguém aparece. O orelhão continua tocando.
Ele lembra que já viu um filme em que o orelhão no meio da rua toca e eram todos terroristas do outro lado da linha. Ela reflete sobre a probabilidade de alguém telefonar para um telefone público na praia e alguém atender. Pois ela mudou toda a probabilidade do momento e atende.
- Alô? - diz a mulher, um pouco encabulada, mas a essa altura a curiosidade já era muito maior que a timidez.
- Oi, será que você poderia me dizer se tá sol aí... - disse a voz do outro lado da linha.
- Tá, uai... sol de rachar... - respondeu a mulher, sem entender nada.
- Mas e o mar, tá bravo ou dá pra tomar banho? - perguntou a voz.
- Tá igual piscina, dá pra tomar banho tranquilo - informou a mulher.
- Ah, então tá, brigada viu. E a voz desligou.
O marido, que ficou afastado do orelhão com medo de que a coisa explodisse, até tentou impedir a mulher de atender o telefonema, mas não deu tempo. Só viu a mulher batendo papo, em um orelhão público, na praia, no Rio de Janeiro, momento esse que venceu a probabilidade de isso não acontecer.
- Quem era? - perguntou o marido
- Sei lá... esses cariocas não batem bem não... por que alguém liga pro orelhão da praia só pra saber se a praia tá boa? E como sabia que alguém ia atender? - comentou a mulher.
- Ah, então vamos ficar mais um pouquinho... a praia tá tão boa.... - falou o marido, com cara de manha.
Voltaram pra areia. Agora foi mais difícil arranjar um espaço, porque àquela hora ninguém se importava com raios UVA e UVB, todo mundo queria estar de frente para o mar. Divertiram-se até o pôr-do-sol naquele burburinho como cariocas da gema num efervescente domingo de verão do Rio de Janeiro.