domingo, 28 de março de 2010

Trabalho motiva?




A única coisa que Frederick Herzberger e Paul Lafargue tiveram em comum foi a origem judaica. Eles não foram contemporâneos (portanto nem se conheceram), não compartilharam ideias ou ideais, não eram da mesma profissão, não nasceram no mesmo país, não falavam a mesma língua e mesmo assim quando me falaram do Herzberger a primeira coisa que me veio a cabeça foi o Lafargue. Eu explico.

Herzberger nasceu em 1923 em Boston (EUA), filhos de imigrantes judeus vindos da Lituânia. Lutou na Segunda Guerra Mundial e ajudou a cuidar da alimentação e da saúde dos judeus sobreviventes do Campo de Concentração de Dachau. Voltou aos EUa, virou psicólogo clínico e professor universitário. Morreu em 2000.

O mais importante mesmo foi que ele se tornou um dos grandes teóricos da motivação do trabalho com a Teoria dos Dois Fatores. Resumindo a teoria: os fatores higiênicos (salário, infraestrutura, ambiente) se não existirem serão desmotivadores, mas o fator motivador mesmo seria o trabalho em si. Seria mais ou menos assim: o que te deixa pra cima mesmo é o trabalho que você efetivamente faz, entendeu?

Aí entra o Lafargue. Lafargue nasceu na Jamaica em 1842, filho de pai mulato e de mãe de origem judaica e caribenha. Foi estudar na França, virou jornalista, ativista político e tão marxista que se casou com uma das filhas de Karl Marx (que a princípio não curtiu muito ter um genro mulatinho). Lafargue não foi teórico de nada, mas escreveu um manifesto genial chamado "O Direito à Preguiça" onde ironiza o "direito ao trabalho" e dá um bronca na sociedade moderna, que ficou viciada em trabalho e propõe a regulamentação de 3 horas de trabalho por dia, para que o trabalhador pudesse passar as outras horas sendo feliz.

Eu, como não sou cientista, não sei se o trabalho em si motiva alguém. Mas a ideia de ser feliz, ah, isso sim, me motiva...

segunda-feira, 22 de março de 2010

Se não guenta, por que veio?


A quarenta minutos da prova, 20 pessoas na sala sentados em silêncio e o baixinho atarracado da cadeira da frente resolve virar pra trás e fazer um comentário:

- É um absurdo, né. A gente não pode sair daqui.

A moça da cadeira de trás pergunta:

- Mas você quer sair? Porque agora não dá mesmo, só depois de uma hora de prova.

- Tá, mas e se eu passar mal, insinuou o baixinho.

- Mas você tá passando mal? Porque aí eles te levam pro posto médico, mas você só sai daqui a uma hora, explicou a moça.

- É um absurdo! Isso aqui parece uma ditadura! - bradou o baixinho, que além de atarracado começou a ficar antipático.

- Você tá passando mal? - perguntou de novo a moça, incrivelmente gentil.

- Nâo... mas eu quero intacto o meu direito de ir e vir. A gente vive numa era de democracia, é o meu direito de ir e vir !- discursou, com ares democráticos, e começou a parecer, além de atarracado, antipático, com aquela cara de tucano...

A mulher da cadeira da fila ao lado não resistiu e se intrometeu na conversa:

- Vem cá, mas se você não tá passando mal e não quer ficar aqui, então veio fazer o quê, colega?

O baixinho atarracado se sentiu ofendido:

- E você é fiscal por acaso? Eu quero o meu direito de ir e vir, só isso. Isso aqui tá parecendo Cuba! Daqui a pouco vai ter gente fazendo greve de fome!

A moça da cadeira de trás respirou fundo, contou até três e ignorou o baixinho atarracado. A mulher da cadeira da fila ao lado achou que o cara era doido e que aliás ele tava bem gordinho e que parar de comer até ia dar um trato no físico... e que aqui, vamos combinar, tá longe de ser Cuba em qualquer sentido...

sexta-feira, 19 de março de 2010

Paz Interior


Repetiu "Om" 25 vezes, sentada no chão, de pernas cruzadas estilo Buda. Repetia e respirava, repetia e respirava. Contou 25 vezes. A paz interior não chegava, não chegava. Bem que alguém tinha lhe dito que não é assim, de bate-pronto. Tentou de novo. Mais 25 vezes repetiu e respirou, repetiu e respirou. Nesse meio tempo pensou na agenda lotada do dia, em todas as obrigações pendentes, no extrato bancário temeroso, no dia que tava tão bonito. A mente vagueou, vagueou, até que resolveu ir ao salão. Foi. Solicitou fazer pé, mão, hidratação profunda e corte. Saiu de lá de mãos dadas com a paz exterior...

terça-feira, 9 de março de 2010

O Fetiche do Macacão


Tinha um macacão verde lindo na vitrine. Lindo e caro. Me imaginei com ele, poderosa. Dormi pensando nele, uma angústia de não ser mais eu sem o macacão. Esse macacão deu um sentido à minha vida. Por isso, hoje não me sinto eu mesma.

Eu não sei de onde nasceu essa necessidade do macacão. Nunca a tive. A pergunta certa é: por que mesmo eu preciso desse macacão? De onde surge essa necessidade, essa angútia de ter o que não se precisa e de ser o que não se é? De onde vem essa certeza de que uma coisa pode preencher aquele vazio dentro de você, sendo que não vai, jamais?

E de onde veio esse macacão do diabo pelamordedeus? Coitado, ele é só o resultado do tempo em que vivemos. Ganhou vida própria num estalar de dedos logo depois de ter sido colocada a etiqueta de preço e provavelmente surgiu das mãos de costureiras mal pagas.
Olhando assim, eu não preciso do macacão. Começo a me sentir eu mesma...acho que posso conviver com isso...

domingo, 7 de março de 2010

Contículo



O massagista pegou a mulherzinha pra cristo naquele dia. Tratou-a como massa de pão: sovou, bateu e amassou. E na dor, ou se ri ou se chora. Mas ela se controlou ou então as gargalhadas iriam preencher todo o espaço vazio. Aguentou heroicamente os 40 minutos, num misto de penitência, martírio e falta do que fazer. Ficou pensando na possibilidade de pensar em outra coisa que não aquelas dores e, assim, terminou o tempo. Na porta, ao sair, a placa dizia: "relax massage".