terça-feira, 15 de novembro de 2011

Love Story



Viu um perfil de mulher, muito delgado, talvez até bonito, levantar a mão para passá-la carinhosamente na nuca do homem, que dirigia. Não podia ver o rosto do homem mas imaginou que sorria distraidamente enquanto recebia o afago daquela mulher. Destrinchou a cena minuciosamente e viu ali uma história de amor.
Pensou que aquela mulher, tão longilínea e misteriosa, com um nariz tão proporcional ao queixo e à boca que parecia perfeito, acariciava a nuca do homem de olhos fechados, com um prazer calmo e quente. Da mulher, ainda que de perfil, sabia-se que estava apaixonada.
Imaginou a paixão arrebatadora, as descobertas um do outro, os sorrisos involuntários, os corações disparados até chegar àquele gesto carinhoso. Imaginou as conversas pelo telefone até de madrugada, os cartões escondidos nas gavetas, as poesias enviadas por SMS, os e-mails ansiosos, as revelações compartilhadas.
A história de amor acabou quando o sinal abriu. Então continuou seu monótono trajeto naquele trânsito desanimador de um dia chuvoso.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Minha alma é hippie


Minha alma é hippie, danço de pés descalços e flores nos cabelos, sorrio para o sol, os pássaros me agradecem, me inebrio com o perfume da vida, choro as lágrimas da chuva, meu corpo é leve, pertence ao planeta...
E acordo ao som de "When the moon is in the seventh house" às alturas...será que ao som de Rocky, o Lutador, eu viro boxeadora?

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Gosto e Não Gosto


Não gosto de tempo. Não gosto de chuva. Não gosto de lágrimas. Não gosto de perder pessoas. Não gosto de avião. Não gosto de brigadeiro. Não gosto de dirigir. Não gosto de esperar. Não gosto de ser enganada. Não gosto de pentear o cabelo. Não gosto de ficar triste. Não gosto de lavar tênis. Não gosto de pequi.

Em compensação: Gosto do vento quando sopra na praia. Gosto de banana. Gosto de verão. Gosto de Saramago, de Neruda, de Sophia de Mello Breyner. Gosto do som da guitarra. Gosto de rock. Gosto de Rolling Stones. Gosto de samba. Gosto de percussão. Gosto de Roberta Sá. Gosto de pão com manteiga e leite com toddy. Gosto de conhecer pessoas. Gosto de gostar de alguém. Gosto de ser gostada. Gosto de fazer silêncio e fechar os olhos pra ouvir o barulho dos outros. Gosto de pôr do sol. Gosto de nuca de homem. Gosto de esmalte colorido. Gosto de nadar. Gosto de mar. Gosto do gosto do mar. Gosto de capoeira. Gosto de beber cerveja quanto tá muito calor. Gosto de ver os outros dançar. Gosto de plástico bolha. Gosto do cheiro de plástico. Gosto de cupuaçu. Gosto de lavar banheiro. Gosto de pastel de banana com canela.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Não me peça o que eu não quero te dar


O texto não é meu, é da Nina Lemos do 02neuronio a parte boa é que mulher quando vira mulher, manda pastar rapidinho uma figura dessas...

“ Desde o começo você sabia que ia ser assim. Não me venha reclamar agora. Não me venha cobrar, pedir o que eu não posso dar. Os meus problemas são meus e você não tem nada ver com isso, não me importa que você chupe o meu pau segundas, quartas e sextas, não me importa que a gente comente o noticiário junto todos os dias.
Não me importa que você mergulhe nos meus conflitos, que eu massageie os seus pés, que a gente se encontre aos sábados debaixo do cobertor, que eu viaje de férias com a família e que você visite meus parentes.Você freqüenta a copa mundial infantil para me fazer companhia ? E dai? Isso lhe dá algum direito?
Quem você pensa que é para se meter na minha vida assim, para exigir de mim qualquer coisa que seja, um grande amor, um crime passional?”
Ela engoliu o resto de choro.
“Ah, não acredito! Ficou chateadinha!”

terça-feira, 5 de abril de 2011

Hoje


Hoje choveu, mas fez um dia lindo. Hoje eu me sinto livre. Hoje eu não fui pro espanhol pra comer clandestinamente pizza com queijo. Hoje teve manifestação e engarrafamento. Hoje eu sorri pelo canto da boca só pra não gargalhar com vontade. Hoje eu tentei sorrir com o fígado mas não consegui. Hoje eu trabalhei com vontade de só ficar nos devaneios mais absurdos no horário de expediente. Hoje eu tentei meditar e depois de dez minutos minha mente virou um zoológico, cheio de bicho exótico. Hoje eu quase consegui ser sensual mentalmente. Hoje eu fui mázinha por dentro. Hoje eu fiquei irritada e me rebelei entrando no youtube pra assistir um vídeo engraçado. Hoje eu descobri que eu adoro ouvir a palavra “fuça” porque eu morro de rir todas as vezes em que a ouço. Hoje eu escutei um monte de gente. Hoje eu falei pra burro numa reunião que era pra ser chata. Hoje eu fui tão feliz...

sábado, 2 de abril de 2011

Eu


Acordou se sentindo indefesa, fraca, inadequada. Ressentida, enraivecida, invejosa. Pequena, ultrapassada, conservadora, careta. Rejeitada, culpada, envergonhada. Impaciente, irritada, paranóica. Sarcástica, maldosa, sombria. Insegura, medrosa, vítima. Mal humorada, intolerante, ansiosa. Má ouvinte, falastrona, equivocada.
No espelho, diante do olhar de reprovação, disparou:
- O que foi? Eu também sou assim! - e bateu a porta do banheiro. Também era mal educada.
Quando saiu de casa, a caminho do trabalho, deu de cara com aquele céu de brigadeiro. Avassalador. Constrangedoramente iluminado. Saiu sob o sol inclemente de um dia maravilhoso que começava assim-assim.
Chegou no trabalho assobiando um samba encantado de tão animado.
E o chefe: - O que foi?
- Nada. Eu também sou assim. - e continuou no sambinha alegre, despreocupado, leve, lindo,loucamente enrabichado pelos mistérios muito misteriosos do contentamento.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Quando os tigres acontecem


Aconteceram tigres no quarto dele naquela noite. Aconteceram tigres na mente, no quarto, no coração. E os tigres, como se sabe, nada têm a temer, nem o acaso e nem o destino. No escuro, os olhos iluminados daquela selvageria felina e atraente, porém incontrolável, inundaram a atmosfera de medo, um medo calado e tímido, com um cheiro de suor contido. Os tigres – agora ele sabe - querem tudo: o quarto, a mente e também o coração. E ainda que se domine a secreta língua dos tigres e se olhe no fundo daqueles olhos selvagens, eles não desistem, querem tudo: o quarto, a mente e também o coração.
Quando os tigres aconteceram naquela noite, não houve tempo para fuga. Porque os tigres, como se sabe, atacam de um golpe só, inesperadamente. E os tigres, quando atacam, olham direto nos olhos. E aqueles grandes olhos bárbaros e inclementes não têm nada a temer e quando chegam aos seus olhos, então é tarde. Chegam à sua mente e também ao coração. E o coração, como se sabe,é forte, mas tem horas que fraqueja. E aí acontecem os tigres, que de um golpe só levantam as garras gigantes e rasgam alguém por inteiro.
Os tigres que aconteceram naquela noite não deixaram vítimas. O quarto foi encontrado vazio, com a cama remexida, o abajour quebrado, a cortina rasgada a golpes de garras afiadíssimas. Não se encontraram corpos e nem tigres. Mas naquela noite, eles aconteceram.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

A quem eu vier a ser


Quando eu me tornar quem eu vier a ser, quero ser um pouco mais. Um pouco mais sábia, pra entender tudo o que eu podia ter feito melhor e fazer. Um pouco mais leve, pra entender que o mundo está a meu favor, porque, sabe, a vida gosta de quem gosta dela. Um pouco mais silenciosa, porque o silêncio diz muita coisa que às vezes a gente nem escuta. Um pouco mais , pra dividir essa loucura toda.
Quando eu me tornar quem eu vier a ser, ah, aí, vou deixar o mundo me invadir que nem vento forte de beira mar, que nem lua cheia em noite de verão, que nem música boa se espalhando pela alma, ah, se eu vou...

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A vida acontece


A vida quando acontece, é um deus-nos-acuda. Não tem jeito, não tem adiamento, não tem reza, não tem prazo, não tem pressa, não tem plano, não tem como. Passa que nem terremoto, que nem tsunami, como boiada desembestada, como ventania insurgente, como revolução popular no Egito.
No meio da confusão, há mortes, mas o que sobrevive, ressurge, revive, reinventa, repensa, remonta, retifica, reconhece a vida que acontece.
Porque, sabe como é, a vida, quando acontece, é pra valer.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Coração bobo


De uma hora pra outra, um coração partido se vê inteiro, mas nunca o inteiro de antes, um inteiro com mil retalhos, com cara de outro coração. Corações partidos rondam por aí, muitos incógnitos e outros nem tanto, mas nesse nosso planeta, de cabo a rabo, do Alasca ao Zaire, de cada dez pessoas, dez terão seus corações partidos em muitos momentos de uma existência inteira. E desses dez, dez terão seus corações inteiros de volta na mesma existência. Então, corações partidos nunca estão sós. Todos os dias, compartilhamos nossas dores partidas com milhares de desconhecidos. E todos os dias, milhares de outras pessoas compartilham sua inteireza, uns com generosidade e outros nem tanto.

O fato é que nessa vida não temos momentos só de inteireza ou não estamos o tempo todo partidos. E os momentos de inteireza ou partidos não são privilégio de ninguém, estamos todos sujeitos a um e outro pelo resto de nossa existência. E a notícia mais chocante é que nossos corações ficam partidos e inteiros muitas vezes em uma mesma vida e ficar partido vai doer, sempre. A boa notícia é que sempre voltamos a ser inteiros, mas não tem regra e nem tempo. Então, tenha paciência, sua inteireza está dentro de você. Mas um coração partido não pode ser ignorado, precisamos passar junto com ele todos os momentos partidos. Ou então, ele nunca deixa de estar partido...